sábado, novembro 08, 2008

Entrevista de caetano veloso a geneton

ALÉM DA REFERÊNCIA DIRETA A JOAQUIM NABUCO,VOCÊ FAZ PELO MENOS DUAS HOMENAGENS NO DISCO, UMA A ANTONIONI, PARA QUEM VOCÊ COMPÔS UMA MÚSICA E OUTRA A JORGE BEM DE QUEM VOCÊ REGRAVOU ZUMBI. É POSSÍVEL COMPARAR O
SIGNIFICADO DE UM E DE OUTRO SOBRE O QUE VOCÊ FAZ?

Caetano Veloso : "Além do Joaquim Nabuco,tenho no disco três
personagens explicitamente homenageados : Raul Seixas, Michelangelo Antonioni e
Jorge Ben. Raul Seixas é homenageado numa canção que se chama "Rock in Raul".
Acabei de ouvir um disco de Tom Zé que tem uma música sobre Raul Seixas.
É como se fosse um cordel que narra a chegada de Lampião e Raul Seixas no
FMI.Os dois estão enfrentando o FMI e Washington.Já no meu disco,Raul aparece
como um sujeito que superexibia a "vontade fela da puta de ser americano".Era o
como Raul Seixas falava - um modo baiano antigo de falar;acho que em
Pernambuco tambem.Pode parecer,a ouvidos mais tolos,que a minha canção
apresenta uma desaprovação seja do Raul seja da vontade de imitar os
americanos. Em primeiro lugar,não desaprovo Raul,um dos meus artistas
favoritos. O primeiro disco de Raul Seixas é um dos melhores já feitos no
Brasil - uma obra-prima. Não havia quase nada feito por outros artistas
brasileiros - pode pensar nos maiores nomes - de que eu gostasse mais.
Havia muito pouca coisa que eu chegasse a gostar tanto quanto eu gostava de
"Ouro de Tolo".
Nunca vivi,como ele e muita gente viveu e vive,a vontade imediata
de ser americano.Não foi assim comigo e com muitas outras pessoas da minha
geração,como Chico Buarque,Paulinho da Viola, Glauber Rocha, Cacá Diegues.
Mas aquele sentimento - mundial diante do que os Estados Unidos se tornaram -
se manifestou ainda mais fortemente nos paises da América. Era a vontade de
chegar à situação do americano.
É como se a vida que podíamos levar não fosse a verdadeira vida.
E' como se,atraves dos filmes,canções e reportagens nas revistas,a gente
visse que ali e' que se vivia a verdadeira vida.Assim como tantos outros,Raul
não queria viver o que não fosse a verdadeira vida. Rita Lee contou numa
entrevista que Raul Seixas disse a ela : "Sou americano.Apenas nasci no país
errado".Todo o negócio do rock vem dessa vontade.

Mas não é só o rock : a Bossa Nova tem muito disso.João Gilberto é
que deu um nó,uma virada.Mas Johnny Alf,Dick Farney,os proprios nomes que eles
botaram em si mesmos,as musicas que eles fizeram....Aloísio de Oliveira - um
letrista espetacular,uma pessoa maravilhosa,um ghomerm que foi tudo para Carmen
Miranda,o namorado,o companheiro,o sujeito que amparou Carmen nos Estados
Unidos,autor de letras lindas com Tom Jobim - tinha aquela vontade louca de ser
americano.Mas,em primeiro lugar,é difícil querer exigir que essa vontade não
apareça.É alguma coisa vivida desde a infância.Também há a admiração do
desenvolvimento harmônico e da sofisticação da música popular americana em
comparação com as outras.Quem tem bom ouvido musical e ouve uma música
harmonicamente mais rica e ritmicamente mais inventiva se sente atraído por
ela,consegue entendê-la, quer reproduzí-la, quer participar daquele mundo.É uma
vontade legítima! O sujeito vê naqueles grupos de rock a sensação de que havia
uma pujança de energia que tinha de ser extravasada em música barulhenta e
roupas espalhafatosas.Então,o sujeito tem,desde criança,uma vontade genuína
de fazer aquilo.Depois de adulto,o que ele faz com aquela vontade genuína é uma
arte que ao mesmo tempo a exiba e e comente com alguma ironia. Não com a ironia
dos tropicalistas - que não vieram daí.Nós não viemos da vontade de
imitar.Eu,sobretudo,não - nem tão pouco Gil,Gal,Bethânia,Tom Zé.
Toda a linhagem do rock vem daí.A música de Raul Seixas trata
disso.Numa frase rápida,a letra diz "e hoje olha os mano..." . É uma menção aos
rappers brasileiros - que também demonstram uma grande vontade de se
identificarem com os americanos.Os nomes que eles escolhem para si são nomes em
ingles,parecidos com os dos negros americanos.É imensamente saudável,porque
apresenta uma vontade de discutir e problematizar o modo como se dispõe o
panorama racial no Brasil.Preferem se chamar Ice Blue,Mano Brown,Carlinhos
Brown.Ganham o nome de James Brown.Isso é tudo muito complexo para mim.É o
estÍmulo da minha vida.
Mas,quando vejo uma vontade muito destrutiva de simplesmente
imitar os americanos - e empobrecer a vida brasileira -,eu digo assim : " Essa
gente merece um Ariano Suassuna". Adoro quando Suassuna mantém aquela
ranzinzinice.Não penso como ele.Penso de uma maneira que ele já disse repetidas
vezes que não aceita.Eu entendo que as pessoas,se traírem essa vontade
genuína,estarão sendo menos brasileiras.Porque é muito profundo,num verdadeiro
brasileiro,sentir a vontade incontrolável de tentar identificar-se com os
norte-americanos ! Não é a única coisa que pode acontecer com os
brasileiros.Mas é um muito frequente,muito compreensível e muito profundo na
formação de uma personalidade brasileira.

Os rappers trazem uma conotação de crítica ao panorama racial
brasileiro.Dizem coisas que a gente não acha em outras áreas da produção.O
rap,para mim,é mais som do que conversa.Eu entendo mais uma letra de uma música
cantada do que um rap.Mas ouvi tanto o disco dos Racionais Mcs que já me
acostumei.Aquilo é de uma beleza enorme.Falam de versos "violentamente
pacíficos" .A gente vê ali uma pujança e uma liberdade de criação artística.Se
eles não tivessem a vontade louca de imitar os americanos,a gente não estaria
hoje contando com eles.Assim é o caso de Raul Seixas.Por esse motivo é que falo
na letra "e hoje olha os mano".Tudo e' exemplo de dignificação dessa atitude.
Quanto às outras personalidades que estão homenageadas no
disco: Jorge Ben é um caso espetacular de saúde cultural,é rock com samba,um
brasileiro preto do Salgueiro que terminou indo viver em São Paulo um período
crucial da vida.Ficou quase tão ligado a São Paulo quanto Chico Buarque ficou
ao Rio de Janeiro.Joge Ben se ligou ao iê-iê-iê em São Paulo porque não podia
aparecer no Fino Bossa : misturava rock com samba.O disco dos Racionais- por
sinal - abre com uma música de Jorge Ben,"Jorge da Capadócia". É preciso ver
que Jorge Ben,como João Gilberto de uma maneira totalmente diferente,fica num
lugar onde essas coisas acontecem.

Jorge Ben tem muito mais vontade de imitar o americano que João
Gilberto.Mas Jorge Ben criou uma solução única,em que a brasilidade entra não
apenas com um percentual importante,mas também como uma função na estruturação da personalidade artística.É diferente de Tim Maia - um artista
interessantíssimo.Por essa razão,Jorge Ben é mestre dos pagodeiros,rappers,
tropicalistas e roqueiros.A gente encontra Jorge Ben nos neo-bossanovistas,nos
discos do Milton Nascimento,nos pagodes,nos Racionais,nos meus discos.Desde os
anos setenta,sempre gravo músicas de Jorge Ben.Os Paralamas do Sucesso
gravam,todo mundo grava.Porque ele é uma solução espetacular.Dá uma sensação de
saúde cultural sem os amparos do status de uma educação de alta classe
média.Não é assim.Jorge Ben não é letrado : é um grande poeta,um grande
solucionador cultural,um sujeito imenso.

Eu me sinto presente ali dentro do disco dos Racionais que
começa com uma música de Jorge Ben que também gravei.Há uma coisa que precisa
ser dita,porque tem a ver com o falei sobre Raul Seixas e Jorge Ben : não é
verdade de maneira nenhuma que grupos de rap,como os Racionais,sejam alguma
coisa destacada da "MPB",algo que se opõe a ela.Tenho horror a esse negócio de
"MPB"- parece uma doença que deu na música popular brasileira.Eu acho errado.
Nunca me identifiquei com essa idéia.O Tropicalismo veio para dizer que não tem
nada a ver com isso.Eu mantenho até hoje essa atitude.Ouvem-se,no disco dos
Racionais Mcs,ecos da minha gravação da música de Jorge Ben - confirmados pelos
componentes dos Racionais,pessoalmente,em conversa comigo.É algo importante,
porque os vincula explicitamente - e o que eles fazem - à tradição da música
popular brasileira.O vínculo já existiria,necessariamente.Mas há um vínculo de
eleição por parte dos artistas.
Num momento crucial,numa das letras mais lindas do
disco,Mano Brown diz assim: "Eu sou apenas um rapaz latino-americano".É a frase
do Belchior que,ali citada,marca a continuidade de história da Música Popular
Brasileira,o diálogo interno da MPB,o que não quer dizer que não haja
diferenças enormes.Raul Seixas sempre foi meu amigo.Vi o último show que ele
fez,aqui no Rio,com Marcelo Nova.Raul já estava quase sem poder falar,sem poder
cantar.Fui homenageá-lo,conversar com ele,porque era meu amigo desde que
voltei de Londres.Nunca tivemos briga,rusga,discordância,nada - nem pessoal nem
artística.Raul Seixas queria ser feito um roqueiro que falava inglês,queria
estudar numa high school,usava bota como se fosse do oeste,vivia vestido de
Elvis Presley. Eu não : desde menino,nunca tive vontade disso.Meu negócio é
outro : eu gostava de Sílvio Caldas.Mas entendi essas pessoas.Vi o que
significava o gosto pelo rock,vejo nos manos hoje.

Quanto a Antonioni : tenho com o cinema italiano uma dívida
imensa -que venho pagando pouco a pouco.Eu gostava dos musicais americanos,mas
tinha uma grande paixão pelos filmes neo-realistas italianos e pelos
desdobramentos do neo-realismo.Fiz uma música sobre Julieta Masina,o que me
levou a ser convidado para fazer um espetáculo em homenagem a ela e a Federico
Felini - que,gravado,terminou saindo em disco.
Depois de ter visto todos os filmes de Antonioni,tive um
contato com ele.A admiração às vezes assombra.Tive um contato pessoal com
Antonioni,graças a meus dois amigos e cineastas brasileiros Júlio Bressane e
Cacá Diegues.Um não se dá com o outro,mas ambos adoram Antonioni.Os dois
convidaram-no para jantar.Antonioni aceitou os dois convites.Todos dois me
convidaram também.Antonioni,então,riu muito,porque eu estava nos dois
grupos,totalmente diferentes.Antonioni não fala,depois do derrame que
sofreu,mas se comunica através da mulher.Quando fui a Roma,tive a surpresa de
vê-lo na platéia do meu show "Fina Stampa".Nem vi que ele estava na
platéia,mas,quando acabou o show,eles vieram ao camarim para falar comigo.
Antonioni tinha ficado muito bem impressionado.
Quando fiz em Roma o show que saiu do disco Prenda Minha,
ele estala na platéia novamente.Voltamos a conversar.Curiosamente,ele não fala,
desde que sofreu o derrame,há oito anos,mas se comunica -muito- através da
mulher,dá opiniões através de gestos.É muito bem-humorado.Gostou muito do show.
Já devo tanto a essa gente,já devo tanto a esse homem.Tento ir pagando pouco a
pouco minha dívida com o cinema italiano - que,agora,acaba de crescer com o
filme de Bertolucci,"O Assédio".Nunca fui fã de Bertolucci,mas "O Assédio" é
uma obra-prima. Eu digo : meu Deus,continua crescendo o meu débito com os
cineastas italianos. Fiz,então,uma música que se chama "Michelangelo
Antonioni".Fiz a letra em italiano,uma língua que mal falo.Organizei os poucos
versos para ficar tudo direito e mandei para Antonioni,para que ele me dissesse
se tinha aprovação.Fiquei muito feliz ao receber uma resposta dizendo que ele e
a mulher tinham tinham aprovado com entusiasmo.Gostaram da canção"

quarta-feira, novembro 05, 2008

Sushi Club – circa 1991

sushi club l

sushi club ll

O Sushi Club em 1991 eu acho era um barato e tocar em cima da Radio Busca, como era chamado o fusca de Bubusca, com Leo Dim controlando o som foi demais